Sentado na areia, perto do mar, ainda meio sonolento, penso como adoro acabar de acordar já na praia. Ainda me espreguiçando. Abril é um dos meses do ano que eu mais gosto no Rio. A luz é belíssima e dias de sol, como o de hoje, deixam a temperatura perfeita para um dia de semana na praia. Na minha rua, Alm. Pereira Guimarães, a praia só dos amigos e conhecidos se torna um lugar muito familiar pra mim. O Dois Irmãos com essa luz de outono carioca fica ainda mais imponente. Sempre penso no meu irmão quando olho.
Havia muito tempo que eu encontrava a Claudia. Eu a reconheci ainda de longe, vindo do fim do Leblon, e ela também. Ao se aproximar deu-me um longo e carinhoso abraço. Ela é uns três anos mais velha que eu, sempre andou com os caras mais velhos, mas tínhamos uma empatia recíproca, que nos tornava amigos, vamos dizer assim, avulsos, um não conhecia os amigos do outro. Amigos de praia. Por ser mais velha, sempre me dava conselhos, como uma irmã. Hoje, ela me pareceu ainda mais velha e com ar sofrido. A última notícia que havia tido era sobre sua separação. Há mais de um ano. Sentou-se ao lado e começou a falar.
-Culpa, culpa, culpa. Até quando sou esbofeteada sinto culpa. Racionalmente sei que, como todo ser humano fui educada para sentir culpa, mas isto não me faz deixar de senti-la. Lembro-me que quando estava grávida, dentre as muitas novas teses psico- educacionais que elaborei para criar meu filho sem traumas, tinha especial predileção pelo capítulo que abordava a culpa. A partir de algo que li, desenvolvi todo um raciocínio de como educar meu filho para que ele não carregue todas as culpas que não tem. Pena que só me lembre disso agora, quando meu filho já está com 6 anos. Se todas as pessoas colocassem em prática aquilo que pensam e criam de melhor, a evolução seria mais rápida. Dentro de cada pessoa existe um revolucionário e um reacionário, e a evolução depende da vitória do primeiro. No meu caso, não sei. Estou me sentindo completamente perdida...”
Continuou falando e contando coisas durante algum tempo e, quando tentei falar-lhe, ela levantou-se, me deu um beijo e um abraço, enquanto agradecia minha amizade. E seguiu seu caminho.
Fiquei ali parado, olhando o mar, pensando nas minhas culpas e no meu lado revolucionário e no reacionário. Nem tive tempo de dizer nenhuma palavra. Melhor assim, aquilo tudo me pegou tão de surpresa, que nem tinha tido tempo de pensar no que ela havia dito. Não tinha muito a ver com meu momento, me deixou meio “sei lá”. Sorri sem perceber e só então eu percebi que estava leve. Acabara de praticar uma das coisas mais importantes da amizade: Ouvir, tentar entender mesmo quando tá difícil, oferecer o ombro e simplesmente estar ao lado. Ser amigo. Se sentir sendo um bom amigo de um amigo faz um bem danado...
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