De
repente, me dou conta que as coisas começaram a entrar num sincronismo que não
existia. Pequenos detalhes se encaixando no momento certo.
O
sabonete que acaba o meio do banho, mas que já tenho outro novinho à mão nessa
hora que preciso. A toalha que não esqueço mais de pegar, a mesma que só me
lembrava que não tinha pegado quando estava fechando o chuveiro no final do
banho. O próprio banho, que gosto tanto e que sempre me traz bem estar. Ainda
mais no verão carioca. A depressão nos tira todos os prazeres, até o da higiene.
De
repente, o encadeamento dos eventos que constroem a rotina diária parece entrar
numa sintonia onde um acontecimento não atrapalha o outro e todos se
complementam. Aumentou a minha capacidade
de tomada de pequenas decisões, como a que me fez comprar o sabonete antes que o de casa
tivesse me deixado na mão, como era comum acontecer. A depressão nos tira a capacidade de decidir sobre tudo e qualquer coisa.
É
meu cérebro se curando, buscando a estabilidade, se consertando.
Se
eu não o atrapalhar, tudo vai continuar a entrar, cada vez mais, em sintonia.
Sintonia
com o quê ou quem? Comigo mesmo. Com a
sensação de me bastar, de não precisar de mais nada do que a água caindo no meu
corpo para sentir aquela sensação de plenitude que estava sentindo vivendo aquele
agora.
Foi
quando percebi que estava fora do inferno. Um grande alívio, um profundo
alívio, do qual sobreveio uma leveza indescritível. Tudo perdeu o sentido de urgência, a
ansiedade se dissipou.
Não
foi mágica, busquei ajuda, pedi socorro. Sózinho, teria morrido. Foi
terapia, foi neuropsicologia, EMDR,
Brainspotting e todas as ferramentas que minha terapeuta utilizou. Foi a ciência
que ajudou meu cérebro a se curar. Deixando-o ser maravilhosamente fantástico como
o de todos os seres humanos, deixando-o se reprocessar e arrumar toda a bagunça.
A ciência foi capaz de me curar intercedendo efetivamente na desensibilização e
reprocessamento de traumas que afetam muito mais do que supunha minha vã filosofia.
Mesmo
com a ajuda qualificada que estava tendo de minha terapeuta desde os últimos
dois anos até aquele momento, eu não acreditava que sairia da depressão. Acho
que ninguém que esteja passando por ela acredita, faz parte da doença.
Mas,
naquele momento mágico e único, a água, o sabonete e a toalha me mostraram que eu estava de
volta à vida. E a vida de volta em mim.
Sobrevivi.
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O Leblon pré-novelas do Manoel Carlos.
Contos e crônicas.
O cotidiano do bairro.
Clipper, Pizzaria Guanabara, BB Lanches, Jobi, Bracarense
e outros lugares tradicionais do Leblon
são os palcos dessas histórias.
A Casa Encantada
Contos do Leblon
Edmir Saint-Clair
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